“Eu queria saber escrever”
“Por quê?”
“Para que eu pudesse descrever essa noite, poder relatar cada detalhe. Escreveria umas cinco folhas.”
Estavam deitados na rede vermelho sangue e o céu estava azul marinho. Deveriam ser onze horas da noite e ele estava programaticamente cheio de estrelas.
Eles estavam cheios de estrelas.
Ele olhava fixamente nos olhos dela algumas vezes e tentava entreter-se consigo mesmo, falava sobre seus amigos bêbados, as pessoas que conhecera ultimamente, a nova roupa de baixo que havia comprado, tudo numa tentativa nunca falha de fugir de si mesmo, daquele furacão de ser humano que tentava habitá-lo, mas que era complexo e triste demais para ser concebido. Ela, para não congelar-se numa pele que não era sua, agia da mesma forma de sempre. Deixava as lágrimas escorrer fielmente sobre os seus lábios enquanto seus olhos estavam fixos na quantidade mínima de estrelas do lado esquerdo do céu, por causa do excesso de luz da Avenida Ayrton Senna.
“Por que você está chorando?”
“Eu não estou chorando, é apenas a posição do rosto”
“O que você está sentindo?”
“ Eu estou sentindo como se estivesse sentada na beira de um rio e estivesse colocando um barquinho para ir embora.”
“ Posso sentar com você?”
“Eu não consigo ver mais ninguém lá. O sol está se pondo”
“ E quando o sol nascerá outra vez?”
“Quando o barquinho tiver desaparecido por completo”
Ele começara a ficar com medo. E ela só queria que ele se entregasse ao medo para que pudesse nunca mais senti-lo, para que pudesse voltar a ser quem ela tanto quis que ele fosse nos últimos dez meses. Mas ele era alguém difícil de se entregar.
“Eu queria confiar em você”
“Eu queria que você me desse paz”
“Hotels were closed
And the airport was clean
I was stranded alone
In my southwest dream
Such a pretty boy”
“Daqui a alguns anos, eu posso estar dirigindo e vou escutar essa música, e lembrarei de você, lembrarei desse dia, da gente dançando na sala, da vodka, da roupa, da rede, do cheiro.”
“Não se dispersa de mim mais uma vez”
Antes de dormir, ela observou o quanto ele parecia um anjo dormindo, o quanto esse era o único momento em que ela se sentia segura com ele, porque já passava de meia noite e os monstros que os habitam já deveriam estar dormindo também. Seria difícil acordar e ver que tudo aquilo não era real o suficiente para durar dois ou três dias. Adormeceram.
Ele só precisava confiar nela
Ela só precisava de paz.
“Eu amo você.”
“Eu também amo você.”
Dez/2010
Nossaaaa...esse texto foi feito pra mim? Me vi em vários parágrafos. Sério mesmo! Perfeito!
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